Ilusões Movediças...
Em nosso registro corporal
A primeira impressão sensorial
É aquela à qual nomeamos dor...
O ar que adentra aos pulmões,
Numa incursão de sopro vital,
O desconforto da luz,
E o calafrio do mundo
Em nossa fina e frágil pele.
Dor! Descrita como angústia
Provinda de fonte indeterminada.
Nascer e morrer,
Experiências de caráter indefinido.
Cruz e Sousa, nacional simbolista,
Descreve tal angústia como:
"Tristeza imponderável
Abismo mistério aflito.
Torturante formidável
Ah! tristeza do infinito".
Existir é suportar o fardo,
É por nas costas pesada cruz.
"Meu reino não é desse mundo"
Nos disse Deus encarnado, Jesus.
Será o mesmo de Platão:
O reino etérico e real das idéias?
E o nosso, o da matéria,
O reino das sólidas
E vaporosas ilusões?
E o ventre materno nutriente e protetor,
Não seria perfeita metáfora da caverna alegórica
Dos medos e crenças que nos acorrentamos,
Sólida e obsessivamente em nosso introito de vida?
Seremos sempre ignorantes e fúteis
Ou até mesmo sábios cegos tateando elefantes
Tecendo hipóteses que são
"corretas em partes
mas completamente erradas"?
Só nos é possível conhecer em parte.
Será que um dia ,lúcidos, veremos face a face,
Como predito por Paulo de Tarso?
E Freud, o que explica tudo,
Não diria que a felicidade a rigor
Não repousa nas claridades desse mundo...
E para tanto buscamos alívio
Em um objeto inalcançável fetichizado,
Promessa evanescente de felicidade...
Ou talvez na relação humana,
Nosso inferno e paraíso,
Ou na fé religiosa ou a douta científica
Ou mesmo em quaisquer das manifestações
Bizarras e profanas da sexualidade.
Ou quem sabe na poesia
Repouse algum alento possível.
Na impossível tarefa de transformar
Letra e sintaxe em tradutores perfeitos
Das inefáveis sensações.
Ou quem sabe nas drogas entorpecentes,
Remédios ou venenos de consumo
Que nos livram da dor
E nos afogam em sensações
De plena satisfação instantânea
Corporal, solitária, indefinível...
Arre! Quantas hipóteses sapientes e incoerentes
Buscarei refúgio nos canção do falecido Raul:
"Pare o mundo que eu quero descer!"
Buscando fugir dessa salada metafísica indigesta
Me deparo com a hipótese kierkegaardiana
De que mesmo a morte não é doença mortal,
Não encerra a finitude do eu e seu desesperar.
Então parafraseio estrofes curtas
De anônimo autor, que pichou,
Em um muro cinza,
Desbotado e desconhecido,
Versos de angústia social e íntima,
Mas mais que moderna:
Desbotado e desconhecido,
Versos de angústia social e íntima,
Mas mais que moderna:
"Deus está morto,
Freud morreu
E eu não tô me sentindo
Nada bem"