Quem sou eu

Minha foto
Este é um espaço dedicado à exposição e divulgação de singelos poemas originários de um personagem fictício francês, inebriado de sonhos e embriagado com devaneios. O sobrenome de tal personagem é um trocadilho com a palavra "fantaisie" que significa devaneio em francês. Jacques é um aedo que teima em devanear por entre os não-lugares desse mundo, por sobre os valores há muito esquecidos e os sonhos que se encontram aturdidos nas malhas sócio-históricas nas quais nos encontramos. É um poeta de um mundo moderno que persiste em sua idealização idílica e fantasiosa, ora melancólica ora radiosa, sobre as intempéries do seu alucinante coração. Sem mais, espero que gostem, comentem, reclamem, sugiram e até corrijam alguns impropérios desse jovem velho cantor. Que o ar fantasiante de Jacques Fant'Aisier se faça presente a todos e que acima de tudo reine a esperança por entre a correria e pragmatismo do nosso real mundo humano. Abraços a todos os visitantes!!!

16 de dez. de 2011

Transcendência.



Transcendência

Imerso em meu mundo
Em meio ao turbilhão
Das águas turvas e túrgidas
De minhas emoções...

Nado num mar bravio
Lamacento e nauseabundo,
Mas respiro calmamente apesar
De tal universo imundo.

Busco traçar o caminho da lótus
Que da lama emerge à superfície
E se mostra alva e limpa e bela
Transcendendo à matérica imundície.

Medito pra ordenar
O caos das minha intempéries
Intempestivas, inenarráveis,
Humanas...

Uma luz branca me envolve
Me protege, me guia.
A calma e a paz me devolve.
Alvo lume que se irradia
Nessa lama escura, densa e fria.

E de repente,
Sorrateira e sutilmente,
Recebo a espiritual pureza
Da lótus mais que divina.

E meu corpo em estado
Alterado de consciência
Coberto de luz,

Vivencia uma divina complacência
Mais que real purificação,
Invade os poros e células,
Músculos, ossos e tendões.

A pureza translúcida
Derrama-se pelo aglomerado caótico
Dos inorgânicos pensamentos
E dos sentimentos dolosos reprimidos.

A luz se propaga
E dá-me a possibilidade
De perceber claramente
A luz e calor do meu privativo 
E peculiar oceano.

E tal qual solvente
Vai transmutando a densidade
Do barrento rio original.
Minh'alma se torna repleta
De inefável contentamento

Por fim, 
Quando de olhos bem abertos.
Já não sei se o que vivi
Era um sonho real em sensação
Ou se a realidade retirou seu véu
Pelo via do devaneio que construí.

Sendo sonho ou realidade
Seu efeito está inscrito em mim:
Energiza e potencializa
Minha semente criativa.

Ali onde teu olhar falha
Inicia-se como fogo
Em verso e rima, a minha fala...

Algo de vaporoso
Que busca a concretude da língua
Ali onde se dissolve
Em lágrimas e sangue
Um sentimento qualquer.

Teu soneto febril
De mulher viva encarnada
A quadratura sagrada feminil
Em estrofes trinas volatizadas.

Perco-me no ar
Dos pensamentos inauditos
Visto-me de pássaro a plainar
No palco etéreo do contentamento.

Meu olhar te faz real
Nas telas do desejo
E nas grades das saudade
Me faço prisioneiro anormal:

Acorrentado à tua imagem
Não por medo ou rigor,
Mas por paixão e vontade.

11 de nov. de 2011

Ilusões Movediças...


Ilusões Movediças...

Em nosso registro corporal
A primeira impressão sensorial
É aquela à qual nomeamos dor...

O ar que adentra aos pulmões,
Numa incursão de sopro vital,
O desconforto da luz,
E o calafrio do mundo
Em nossa fina e frágil pele.

Dor! Descrita como angústia
Provinda de fonte indeterminada.
Nascer e morrer,
Experiências de caráter indefinido.

Cruz e Sousa, nacional simbolista,
Descreve tal angústia como:

"Tristeza imponderável
Abismo mistério aflito.
Torturante formidável
Ah! tristeza do infinito".

Existir é suportar o fardo,
É por nas costas pesada cruz.
"Meu reino não é desse mundo"
Nos disse Deus encarnado, Jesus.

Será o mesmo de Platão:
O reino etérico e real das idéias?
E o nosso, o da matéria, 
O reino das sólidas
E vaporosas ilusões?

E o ventre materno nutriente e protetor,
Não seria perfeita metáfora da caverna alegórica 
Dos medos e crenças que nos acorrentamos,
Sólida e obsessivamente em nosso introito de vida?

Seremos sempre ignorantes e fúteis
Ou até mesmo sábios cegos tateando elefantes
Tecendo hipóteses que são 
"corretas em partes
mas completamente erradas"?

Só nos é possível conhecer em parte.
Será que um dia ,lúcidos, veremos face a face,
Como predito por Paulo de Tarso?

E Freud, o que explica tudo,
Não diria que a felicidade a rigor
Não repousa nas claridades desse mundo...

E para tanto buscamos alívio
Em um objeto inalcançável fetichizado, 
Promessa evanescente de felicidade...

Ou talvez na relação humana,
Nosso inferno e paraíso,
Ou na fé religiosa ou a douta científica
Ou mesmo em quaisquer das manifestações
Bizarras e profanas da sexualidade.

Ou quem sabe na poesia
Repouse algum alento possível.
Na impossível tarefa de transformar
Letra e sintaxe em tradutores perfeitos
Das inefáveis sensações.

Ou quem sabe nas drogas entorpecentes,
Remédios ou venenos de consumo
Que nos livram da dor
E nos afogam em sensações
De plena satisfação instantânea
Corporal, solitária, indefinível...


Arre! Quantas hipóteses sapientes e incoerentes
Buscarei refúgio nos canção do falecido Raul:
"Pare o mundo que eu quero descer!"


Buscando fugir dessa salada metafísica indigesta
Me deparo com a hipótese kierkegaardiana
De que mesmo a morte não é doença mortal,
Não encerra a finitude do eu e seu desesperar.

Então parafraseio estrofes curtas 
De anônimo autor, que pichou, 
Em um muro cinza, 
Desbotado e desconhecido,
Versos de angústia social e íntima,
Mas mais que moderna:

"Deus está morto,
Freud morreu
E eu não tô me sentindo
Nada bem"

24 de out. de 2011

Teus olhos...


Teus olhos...

Em teu singelo olhar
Repousa um fulgor 
Resplandecente
Um lume alvo e cintilante.

Incandescência endotelial
Chama edulcorante
Mais que visceral,
Ardente em orgânica textura,
Carnal sedimento,
Sensual loucura.

Teu par de olhos
Narram ímpar enredo
Expõem em sussurros
Passionais segredos:

Sonhos tão sutis,
Evanescentes no frescor
Objetivo do oxigênio pulmonar.

Teu enigma é tão sincero
Que ouso, pueril e silenciosamente,
Tatear respostas convincentes
Que acalmem fugazmente
Meus mais românticos
E tresloucados desvarios.

Vejo em teus belos olhos
A gênese de etéreo sentimento
Um signo inconfundível
De um inefável contentamento...

7 de out. de 2011

Os sete milagres da criação!



Os sete milagres da criação

Aurora, nascer do sol!
Com suaves raios, tal divino farol,
Em seu alvo encanto
A iluminar o planeta
Em todos os recantos...

O mar
Com suas ondas a emanar
A inefável brisa a nos acalmar
Dos tormentos dos íntimos conflitos
Que ostentamos quando tristes e aflitos.

O perfume das rosas
Das margaridas, sândalo, jasmim
A nos preencher os pulmões.
Com frescores brancos, amarelos, rosas
Ao refletir as cores do belo jardim
Edênico, repleto de etéreas emanações.

A chuva a precipitar
Na terra sempre a renovar
A lavar do ar e da terra
Toxinas, impurezas...

O canto sublime dos pássaros
O companheirismo silencioso dos cães
A agudeza e manha dos felinos
A longevidade das tartarugas
A paciência das belugas
As piruetas dos golfinhos.

A queda íngreme das cachoeiras
O som desfilando pelos abismos
A espuma das suas corredeiras
O choque das água em maviosos sismos.

O nascimento
De um botão de flor
O florescimento de um novo amor...
De um novo matiz
De uma singela cor...

Vi surgir o lume do sorriso
A dissolver a tristeza, o duro siso.
A doce gênese de um novo ser,
A semente ínfima a amadurecer,
Tudo isso e mais um pouco
Faz surgir no peito o milagre sutil da vida.

20 de set. de 2011

Panegírico ao Hoje


Panegírico ao Hoje.

Andei cabisbaixo
Por várias horas, anos e dias...
Deitei meus olhos
Em sonhos inertes e sombrios.

Dirigi minha raiva contra mim
E lágrimas sangrentas escoaram
Por sob minha máscara calma e fria.

E esqueci de olhar o céu
Com minhas costas encurvadas.
E me fiz preso à terra morta
Ao invés de voar em etéreas asas.

Mas que nunca seja tarde
Para que eu diga te amo!
Que eu nunca me esqueça
Que posso sempre aprender

Ao me desprender de antigos ritos
Quando ao menos me fortalecer,
E me for possível reconhecer
E enfrentar os fóbicos mitos.

Que eu sempre me lembre
Da sinceridade do teu riso.
Que eu, hoje, me ruborize
Ao encontrar o lume dos olhos teus.

Que meu adeus
Deixe saudades em ti
E que andemos juntos
Mesmo que não estejas aqui.

Que eu chore de felicidade
Por ter estado contigo
Que eu construa minha fortaleza
No olhar e no abraço amigo.

Que os sonhos defuntos
Sejam o solo de alvas rosas
E que as horas pesarosas
Tornem-se palcos de novas belezas.

Em nosso mundo mutável,
Em verdade tudo passa.
Desejo que eu cresça com a dor minha
E que seja eterna, hodierna, a divina graça.

Que o presente, dádiva de Chronos,
Seja a tela onde nos é possível imprimir
Um texto original, simbólico, singular,
Baseado no pretérito lugar onde nasci

Subvertido nos sonhos que co-construi
No imaginário porvindouro do amanhã
E que, no real repousa, exponencialmente,
Nas teias do agora e do aqui. 

18 de set. de 2011

Em um não lugar...


Em um não lugar...

Em um não lugar
As horas custam a passar
Os segundos caem a conta-gotas...

Nos tornamos invisíveis
Passageiros errantes, indiferentes.
De tão comum, invisíveis,
Tristes transeuntes, impacientes.

Em um não lugar
Somos também indefinidos:
Lá não é possível conceituar
Somos mero limbo, esquecidos.

Por entre o solo frio
Dos fechados e abafados corredores,
Nos recostamos no vazio
Dos indistintos e inumeráveis senhores.

O tempo de lá - do não lugar -
É o das filas intermináveis,
É o do fluxo de pessoas incontáveis,
O horário inestimável, acidente, singular...

É a trama da vida
Que lhe dá sentido
E a necessidade aturdida
Que impõe seu próprio imperativo.

Nosso nome não importa
Mas talvez importe nosso desejo
Quando enfim se abre a porta
E em parcos instantes somos atendidos.

Nas horas vazias do não lugar
Podemos criar mais de mil teorias
Ou das preocupações cotidianas nos ocupar
Ou até nos contorcer em impropérios e agonias.

Teus olhos já não saem
Do meu embargado pensamento.
Eles me atiçam, me atraem
Nossos melhores momentos.

E percebo que também
É possível, de olhos semi-abertos, 
Devanear que estou alhures
Noutro lugar que não do não lugar.


14 de set. de 2011

Ressaca Visceral


Ressaca Visceral

Bebendo vinho sozinho
Me deparo com as mais duras
E dolosas e vaporosas
E ilusórias verdades...

Me encho de sutis alegrias
Sou palco de excentricidades
Sou estrada escura e fria
Rota marítima de extremidades.

Senhor de mim mesmo
Dono de um mundo idealizado.
Ser errante sem norte, a esmo,
Cheio de idéias mas em mim mesmo
Aprisionado.

Ressaca cruel
Que a tudo tinge de cinza.
Doce veneno, gostoso fel,
Que entorpece, desfaz a máscara,
Despedaça, sem piedade, rijo escudo.

Eleva meu ego de euforia
Sufoca-o levemente em nostalgia
A esperar uma sutil novidade.

E desidrato minh'alma dos sonhos
Ensaio socialmente rostos risonhos
Sou homem, sou fera,
Sou pura indecifrabilidade.

Fascinação



Fascinação
                                          Machado de Assis

A vez primeira que te ouvi dos lábios
Uma singela e doce confissão,
E que travadas nossas mãos, eu pude
Ouvir bater teu casto coração,

Menos senti do que senti na hora
Em que, humilde - curvado ao teu poder,
Minha ventura e minha desventura
Pude, senhora, nos teus olhos ler.

Então, como por vínculo secreto,
Tanto no teu olhar me confundi,
Que um sono puro me tomou da vida
E ao teu olhar, senhora, adormeci.

É que os olhos, melhor que os lábios, falam
verbo sem som, à alma que é de luz
- Ante a fraqueza da palavra humana -
O que há de mais divino o olhar traduz.

Por ti, nessa união íntima e santa
Como a um toque de graça do Senhor,
Ergui minh'alma que dormiu nas trevas,
E me sagrei na luz do teu amor.

Quando a tua voz puríssima - dos lábios,
De teus lábios já trêmulos correu,
Foi alcançar-me o espírito encantado
Que abrindo as asas demandara o céu.

De tanta embriaguez, de tanto sonho
Que nos resta? Que vida nos ficou?
Uma triste e vivíssima saudade...
Esse ao menos o tempo a não levou.

Mas, se é certo que a baça mão da morte
A outra vida melhor nos levará,
Em Deus, minh'alma adormeceu contigo,
Em Deus, contigo um dia acordará.

10 de set. de 2011

Tarde Cinzenta.




Tarde cinzenta

Deixa eu ver se entendi!
É pra te mostrar meu mundo
Mas depois, ao seu desejo,
Devo deixá-la, sozinha, partir?

Meu calor, minha cor.
Meu verniz e minha coleção
De pequenos abajures
E caquéticos murais...

Minhas cicatrizes
Que ganhei nas lutas mais desiguais.
Meus sorrisos
Que inventei no seio de qualquer ilusão?

Agora quem não entende sou eu!
Como posso eu agir assim:
Quando desejas meu coração
Encontras a mais eterna inércia
Do meu corpo em nossa cama?

Me beijas com sofreguidão
Mas não sei se nos amamos
Ou a quem de nós dois será
Que a maldita solidão engana.

Estou seco!
Como um carvalho preto antigo,
Seco...

Nenhuma emoção
Se anuncia por aqui.
Nenhuma bela canção
A me fazer sorrir.

Ressaca, tristeza,
Tédio e solidão,
Quarteto da angústia;
Compondo uma ressaca infernal.

Até as lágrimas de sangue
Que brotaram de minhas órbitas
Esfriaram e secaram na fonte.
Nasceram, faleceram
Sem nenhum alarde.

E o frio
Que percorre cada artéria
Se faz tão sólido quanto
Qualquer inorgânica matéria.

Se propaga feito qualquer epidemia,
Uma peste a roubar qualquer
Sopro de autêntica vida.

Já não sei mais
De que terra sou rei!
Em que terra de desejo,
Sem desejar, me prostei?

Deixe-me a sós
A me curvar perante minha dor
No deserto das minhas mais
Lógicas e idiotas ilusões.

Talvez um dia encontre algum oasis
Ou algum ouro especial azul
Em minha tetra meditação vespertina...

Ou talvez não!
Nem sei nem to afim de saber!
Só quero em verdade verter
O olhar em minha própria,
Cinza e gélida, direção.

5 de set. de 2011

Antigo Fantasma


Antigo Fantasma

Em noites de solidão
Imerso na escuridão
Da minha alcova triste e fria...

Aparece subitamente em meu leito
Um sentimento pesaroso feito
Uma dor que outrora já sentia.

Como se um antigo fantasma
Trouxesse a mim uma crise de asma
Por me sentir tão só e sensível à dor.

Ele vem trazendo a melancolia
E a lembrança de que ela seria
Eternamente a companheira desse tetro cantor.

Por favor não me faças mais chorar 
Ficar tão desesperado por lembrar
Que sou tão fraco e covarde.

Me liberte dessa fria prisão
Diminua a dor que me invade o coração
Ao sentir medo do amor e não, alarde.

Perdoe-me juiz rígido e justo
Pois eu já paguei o custo
De ser um criminoso tão vil.

Tenho em minh'alma arrependimento
Já nem conheço mais o contentamento
E até a morte, a minha existência, já requeriu!

Me liberta dessa pesarosa culpa
De cometer um crime sem desculpa,
O crime bárbaro e inaceitável...

De nomear meu próprio peito
Do meu ódio mortal, o alvo eleito,
Por Ela ter me julgado um ser deplorável.

Ela se assustou comigo e cedo partiu
Deixando apenas o retrato da sua face em perfil
Condenando o silêncio, ao se calar,...

A ser o sinônimo da dor e indiferença,
A ser sombrio mensageiro da minha doença,
A ser quem me açoita por querer amar.

Não me tortures mais carrasco
Já sou tão deprimente que tenho asco
Da minha maldita existência.

Destruas meu ódio ao invés do coração,
Pois sofro insuportável maldição
De ter, do amor, somente eterna ausência.

Por que me trazes em tua visita
Essa tristeza tão silenciosa e infinita
Que aprisiona meu olhar ao nada?

Que os anjos intervenham em minha tortura
E tragam o calor, a cor, a cura
Da doença mortal que a minh'alma degrada.

E quando de novo, enfim, vier
Alguém que em seu olhar trouxer
O inefável lume do amor e do desejo...

Eu já esteja livre pra acompanhar
O seu belo riso e seu triste pesar
E não o medo do abandono
Ao sabor de teu beijo.

Que eu possa dar-lhe calor
E trazer proteção, força e cor
Quando ela se sentir triste e impotente.

Que ela possa me fazer,
Com sua ternura,
Afrouxar as defesas,
Esquecer minha desventura

Me devolver a força para não mais,
Do antigo fantasma receber novamente
O medo de vir a sofrer,de presente.

31 de ago. de 2011

Alice no pais das desventuras



Alice no país das desventuras

Ao invés de adentrar
No mundo das maravilhas,
Alice se diverte
Na escuridão noturna
Das madrugadas irrompidas,
No torpor das drogas consumidas.

A luz do dia, em seus olhos,
Irradia ressaca e tédio burguês.
A noite em seus mistérios convida
A uma caverna de sons e
A mais uma bebida...

A voar nas rodas
De qualquer Pégassos errante
E a delirar nos ardentes sons
Da inefável flauta de alguém
Que a lembre Pã...

Alice só quer se divertir,
Liberar fantasmas reprimidos
E paraísos artificiais consumir
Avessa à hiprocrisia social

Mas Alice entorpecida
Não vê que acabou se tornando
Aquilo que mais desprezara...

Pensando ser rebelde
Em radiante causa nobre
Ela um dia se descobre
Consumidora do descartável
Sendo uma outsider
Do hipócrita sistema burguês.

A música que Alice compõe
Faz uso de acordes
Que nos ajudem a acordar
Da suposta sandice que há
No nosso sistema social capitalista.

Mas quem sou eu pra julgar Alice
Se em meus versos,
Repletos de maluquices,
Estão fartos de ecos dissonantes
De canções compostas no mesmo sistema?

Vá Alice em seu trajeto consumista
Quem sabes encontras um heroína
Que te conduza a um real caminho...

Ou quem sabe uma loira gelada
E maldito cigarro te levem
A filosofar ilusórias verdades...

Ou a companhia do vinho
No enredado banquete
De improvisadas filosofias
Advindas de improfícuas banalidades.

Eu, amante dos versos,
Consumidor de palavras e idéias
Não sei que caminho traçar...

Talvez um dia encontre Alice
Em qualquer encontro de ruas
Perpendicular...

No movimento do mundo
Do qual só a Providência há de saber
Ou mesmo o Acaso,
Senhor das causas materialistas.

Não sei!
Nem sei se um dia quererei saber!
Alice a seu modo noturno
E eu em minha cadeira, pueril e soturno...

Tentamos, a nosso modo,
Encontrar algum abrigo
Em meio ao constante perigo
De habitar, não passageiramente,
No país tétrico das desventuras. 

23 de ago. de 2011

Queda e Ascensão



Caí!
Sozinho caí!
Fui ao chão, o da realidade,
Quando o alçapão ilusório
De meu mais carente desejo
Se me fez presente 
A cobrar seu preço...

Sua aparente solidez
Evanesce ao constatar sua matéria.
Sua coesão vaporosa se desfez
Se firmando a solidão, a dor,
E a frieza insuportável da Sibéria.

Mas heis que alguém me surge
E facilmente me auxilia a levantar.
Será que era alguém real
Ou será um outrem projetado
Dos contatos introjetados
Que outrora tive?

Alguém...
Senhor em fantasia ou realidade,
Alucinação ou de carne e osso,
De verdade, alguém...

Que permeia até hoje os meus sonhos
Que se imiscui por entre vários nomes
E que assume perante mim
Morfologias diversas,
Desconhecidos sobrenomes.

Me estendeu sua mão
Rija, segura e firme,
Mãos de carpinteiro,
Que me suspendeu por inteiro
Do gélido e solitário chão.

E tive então meu corpo erguido,
Minh'alma aquecida.
O meu olhar fora vertido
Do chão ao inefável infinito.

E heis que me fora 
Mais que me soerguer do chão,
Mais que companhia ao coração
Ou qualquer equipamento
Pra me aquecer do frio...

Fora transcender a dor
Da queda derradeira.
Fora preencher uma falta
Presente a vida inteira.

Encheu-me novamente
De esperança
Tal qual criança
Tateando a vida
Que se lhe apresenta.

Parafraseando a máxima sartreana
"O inferno são os outros!"
Digo-lhes que são também
Confusa e Paradoxalmente
Nosso potencial paraíso.

Ao nos ofertar
Nosso próprio lado oculto
Ao nos convidar
Para conhecer um novo mundo

Ao nos presentear
Com a humanidade
Que afugenta o vulto
Da constante, indesejável,
Desditosa e fria companhia
Da solidão...

17 de ago. de 2011

Olhar Soturno


Olhar Soturno

Meu olhar perdeu seu foco
E  inerte diz ao teu: Adeus!
Abandona-se à própria sorte
Flertido sobre o gigante e indefínivel
Infinito...

Ele se esvai e sólido, 
Sublinha o próprio ar
Numa sublimação desvairada,
Regrada pelas leis da Loucura.

Pra' onde se lança
Esse olhar contemplativo
E ao mesmo tempo ausente?
Onde repousa seu destino?

Não sei e talvez nunca o saberei!
Mas se o meu olhar como dizes:
"Desvaria!"...

Ele não há de badalar
Ruidoso sino presente
Em sua majestosa e solitária
Torre de marfim?!

10 de ago. de 2011

Presente meu no niver teu!



Presente meu no niver teu

Ontem e hoje, aqui e lá...
Tempo e espaço se entrelaçam
Num ósculos de astros
Luminosos e noturnos.

E eu, antes soturno,
Filosofava banalidades
Numa superficialidade intrigante...

Me vejo agora em meu quarto
Com a pena em punho, 
Em frenética inspiração,
Tentando registrar um misto
De carinho, atenção e atração...

Como fora difícil frear
A vontade de unir meu corpo ao teu
Ao descobrir teus pontos-fracos:
Portais de obscenos desejos.

Esquentar teu corpo
Com meus mais ardentes desejos
E experimentar mil maneiras
De provar e roubar teus beijos.
  
Noite mágica
De ciclo e renascimento teu
Onde a noção de tempo e o espaço
Se encontram em surreal evanescimento.

À cada esquina, o sinal vermelho
Nunca me fora tão bem-vindo:
Para reencontrar teus lábios
Em ardentes desejos, 
Sensuais ebulições...

Manter a atenção
Era quase que tarefa impossível,
Pois os teus beijos e cafunés
Me endereçavam a outro maior
E melhor foco: você!

Nunca me fora tão penoso
Lidar com as sociais convenções.
Deixar-te em teu próprio lar,
Fora causa de torturantes frustrações.

Abandonar meu desejo à tua porta
Ao singelo e inefável nascer do sol.
Fez cair o ocaso em meu desejo

Dormi pouco esta manhã
Sem ressacas e sem lamentos.
Só a sensação de um meio contentamento:
De te-la em meus braços
E te levar ao teu alvo lar. 

9 de ago. de 2011

Capoeira da Vida





Capoeira da Vida

Makulelê príncipe era
Em sua tribo africana,
Aprisionado numa guerra
Fora vendido como cana.

Transportado como bicho
Se morresse era menos um
Se vingasse o lucro era bom.

Em um nicho de imundície
Num lugar superlotado comum
A dor cantou forte em raivosa sandice
Tentando reinar com seu tom.

E Makulelê não compreendia
Por que fora lançado para morte
Buscava em vão um sentido para tal sorte
E viu passar a alegria pelos seus saudosos olhos.

Fora arrancado de sua terra
E Jogado num navio imundo.
Lutava agora uma interna guerra
Entre as luzes e trevas de seu mundo.

Seu nome fora mudado
Seu destino fora traçado
Por senhores de escravos, brancos.

Seu corpo fora examinado
Como boi fora marcado
Mas sua alma não se rendera aos prantos.

Conservou em seu peito
O sonho de liberdade
Fez de Jesus, seu Senhor eleito,
Sua evidente verdade.

Do horizonte da verdejante fazenda
Viu mais além um dia radioso.
Esperou o sol voltar para sua senda
Pôs em ato seu plano primoroso.

E pelas brenhas do mato foi fugir
Guiado pela silenciosa e prateada lua
Mas vários houve a lhe perseguir
Capitães do mato alcançaram a carne tua.

E fora açoitado ao limite da morte
E lembrou-se do exemplo do Deus vivo, Jesus.
Que aos homens pregou e fora,
Por eles, pregado na cruz.

E pediu, a exemplo do divino mestre,
Por seus carrascos sincero perdão.
Seus olhos bradaram um lume genuíno
Guardou paciente uma singela oração.

Mostrou-se humilde, manso e paciente
E labutou em silêncio por vários meses.
Recordou-se de seus antigos parentes
Engenhando mudo o alicerce de uma nova arte.

Camuflada em dança e diversão
Com palmas, canto, percussão.
Adicionou golpes de animais
A suas danças ancestrais.

Ginga, giro de pernas, cabeçada,
Marcados por um instrumento de uma corda só
Mas capaz de tocar qualquer música orquestrada.
Com sua cabaça é capaz de tocar toda a escala de dó.

Luta sábia e traiçoeira
Busca a fraqueza do inimigo.
Arte ritmada e mandingueira,
No vacilo alheio faz seu abrigo.

É ataque e defesa a um só tempo
Oferecendo seu corpo em sacrifício.
Dando-lhe a cara pra bater...

Mas eis que se esquiva em último momento
Desferindo forte e lépido artifício
Que derruba o outro sem ele perceber.

Makulelê adicionou acrobacias
À capoeira de pura resistência.
Sua alforria com as pernas ele ganhou
Os anos lhe dotaram de malícia e paciência.

Seu quilombo fora encontrado
Com mosquetes seu corpo fora alvejado
A morte, por fim, veio lhe guiar...

Admirada com o edifício que ele construiu,
A pretérita história do nascente Brasil ficou.
Sua triste escravidão, sua liberdade a conquistar.

Zabelê Makulelê,
Símbolo do povo malê,
Alma livre do escravo que persistiu.

Sincretizou sua religião
Engenhou sua própria canção
Na luta, arte e dança que construiu.

Capoeira é arte de resistir
De levantar das rasteiras da vida
É um caminho criado para o livre sonhar.

Vai Zabelê jogar em outros ares
Mas nos oferte sempre tua sabedoria de vida.
Ensina-nos a derrotar nossos próprios males
E a fazer da humildade, a corda firme
Que sustentará nossa vida.